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Em Brasília, vamos encontrar uma produção videográfica que foi inicialmente ligada ao antigo e depauperado curso de Cinema da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília1. Como única alternativa, nos anos 70, para o trabalho em vídeo e televisão, os alunos dispunham de uma câmera Hitachi-Shibaden, em preto e branco, com VT em ¾”, utilizada desde por volta de 1968/69, até o momento em que sai de atividade em 19882.
Já no início dos anos 80, em parceria com a ESAF (Escola Superior de Administração Fazendária), que cedia seus equipamentos em formato U-Matic Pal-M – padrão hoje em desuso –, e graças ao aguerrido esforço dos pioneiros, foi possível a realização de pequenas produções em cor, ainda com escassos recursos. Podemos constatar, à época, um crescimento intenso do interesse pelo vídeo por parte de realizadores independentes ligados à UnB (estudantes, professores, artistas etc.), motivados tanto pelas novas possibilidades de expressão como pelo relativo baixo custo de produção, se comparado ao do cinema.
Estimulados pelo Professor Climério Ferreira, durante o Curso de Verão de 1982 da Faculdade de Comunicação – UnB, foram produzidos oito videofilmes, tendo como temática personalidades e aspectos típicos de Brasília. São dessa época os seguintes títulos: Indiferença (1982) e Atrás do Trio Elétrico (1982), de Marcelo Coelho; Energia em Movimento (1982), de Cynthia Rosa e Marília de Castro; Eros (1982), de Cynthia Rosa e Selma Regina; e Estradas (1983), de Armando Bulcão, Cláudio Pinho e Marcelo Coelho.
Também nessa época é realizado o vídeo Orestes (1983), do grupo Hundredone Producyones, gravado inteiramente no campus da UnB, em que se misturam o teatro e a realidade documental, com a direção de Almir Oliveira, Carmem do Vale e Cláudio Pinho. O grupo tinha uma forte presença no dia a dia do campus universitário. – O nome hundredone era uma alusão ao famoso cinejornal Canal 100 (criado pelo documentarista carioca Carlos Niemeyer, presente nas salas de cinema brasileiras de 1959 a 19863). O Hundredone projetava filmes polêmicos e fora do circuito comercial, além de promover o debate sobre questões culturais na Universidade.
Dentre os vídeos relacionados acima, encontramos alguns com preocupações mais documentais, outros mais envolvidos em pesquisas estéticas e/ou ficcionais, mas todos buscam nessa nova mídia que se oferecia conceitos audiovisuais que satisfizessem as inquietações de seus realizadores. Pouco restou desse material produzido entre 1982 e 1983, além do que conseguimos recolher, mas em condições já deterioradas.
O crescente aumento da portabilidade e a comprovada eficiência educacional, associados ao aumento da demanda por produtos, provocam um notável incentivo ao processo de aquisição de equipamentos televisivos nas instituições educacionais. Com esse ânimo, são montados núcleos de produção em vídeo na Faculdade de Comunicação da UnB, que adquire um equipamento portátil no formato VHS, e também na Faculdade de Educação, que empregava o formato U-Matic Pal-M.
Na Fundação Educacional do DF foi formado o NUTEL, também com o formato U-Matic Pa-l M, em torno do qual se aglutina então uma boa parte dos produtores independentes da cidade, na primeira metade dos anos 80. Ali se produziram inúmeros trabalhos, em sua maioria documentários.
Também na Fundação Pró-Memória e na Fundação das Pioneiras Sociais (Rede SARAH) foram implantados núcleos de produção em vídeo. O formato utilizado na época foi principalmente o U-Matic Pal-M, mas também se utilizou o NTSC, um formato empregado nos EUA.
A partir do apoio das estruturas institucionais, ocorre uma maior produção, e mais diversificada. Um marco nesse processo foi a criação, em 1986, do CPCE, o Centro de Produção Cultural e Educativa da UnB, para atender à comunidade universitária. – O projeto nasceu da iniciativa de uma rede privada, a Rede Globo de Televisão, que apoiava o governo militar do General Figueiredo. A UnB seria usada numa triangulação com o BID, o Banco Interamericano de Desenvolvimento, para repassar milhões em equipamentos, a fundo perdido. Esses equipamentos seriam repassados ao CPCE após serem utilizados pela Globo durante inacreditáveis dez anos.
O CPCE disponibilizou equipamentos completos para produção em televisão e cinema, que incluíam câmeras profissionais de vídeo e de cinema, ilhas de edição e finalização, telecinagem etc., e manteve importantes parcerias, com uma produção bastante rica educativa e culturalmente. Funcionou finalmente como importante escola, na formação de inúmeros profissionais na cidade.
Dentre a produção está a série Estação Ciência, uma parceria com a Ema Vídeo, e os programas TV UnB, Humanidades e Documentário UnB. O CPCE também coproduziu, com o GDF e o Polo de Cinema e Vídeo Grande Otelo, vários filmes, entre os quais Conterrâneos Velhos de Guerra (Vladimir Carvalho), A Terceira Margem do Rio (Nelson Pereira dos Santos), Círculo de Fogo (Geraldo Moraes), O Cego que Gritava Luz (João Batista de Andrade). – Muitos sonhos e projetos experimentais, alguns inclusive premiados nacionalmente, foram apoiados pelo CPCE, entre os quais trabalhos finais de graduação, especialmente das Faculdades de Comunicação e Educação.
É relevante citarmos a crescente demanda gerada pela expansão do mercado televisivo e publicitário na cidade e no país nos anos 80. Isso deu origem a inúmeras produtoras privadas, com padrão de qualidade compatível com as necessidades técnicas da televisão comercial. É quando surgem produtoras como a Ema Vídeo, em 1987, que produz a série Estação Ciência, em parceria com o CPCE, a partir de 1988. Foi quando surgiram ainda as também pioneiras Câmera4, em 1987, e Apoio Vídeo, Interface e Provídeo, entre outras precursoras, todas mais ou menos na mesma época. – Vale lembrar que, além de atender ao mercado corporativo e publicitário, as produtoras de vídeo também apoiam inúmeras realizações de arte e invenção, que contribuem significativamente para a qualificação da produção local.
Uma iniciativa pioneira para a divulgação de trabalhos em vídeo no Distrito Federal se dá com o Projeto Conviva Com Vídeo, que realiza o 1o Circuito Centro-Oeste de Vídeo, na Sala Alberto Nepomuceno do Teatro Nacional Cláudio Santoro, em 1985, organizado pelo Núcleo de Produção e Veiculação de Vídeo da FCDF. Essa mostra foi um primeiro rastreamento da produção videográfica realizda na região, a maioria ainda produzida no formato U-Matic Pal-M4 .
Fazem parte do 1o Circuito Centro-Oeste de Vídeo os já citados Indiferença, Atrás do Trio Elétrico, Energia em Movimento, Eros, Estradas e Orestes, e também Cora Coralina, de Paulo César Cerqueira Leite; A História de Brazlândia, de Maria Coeli; Pioneiros 19 – Cinema e TV em Brasília, de Marco Antônio Guimarães; Escola de Escândalo, de Henrique Hermeto; Quincas e Albertino, de Sérgio Moriconi; Paisagem, de Wagner Hermuche; Bem-Te-Vi Brasília, de Tânia Quaresma, e Terra, de Ana Tapajós. Estes são alguns exemplos de obras daquela época, mas algumas infelizmente se perderam.
Desde essa fase inicial, a divulgação de trabalhos de vídeo em Brasília passou a ocupar, num crescendo, mais espaço no universo cultural da cidade. Cursos realizados e expressivas mostras nacionais e internacionais resultaram em aumento de interesse por parte dos produtores. Atraídos pelo estilo independente de produção, alguns jovens lançaram mão dos recursos e equipamentos disponíveis para dar vazão aos seus anseios de videastas.
Foram então realizados os vídeos Eudoro (1986), com depoimentos do fundador do Departamento de Filosofia da UnB, o professor e helenista Eudoro de Souza, e O Mar de Mário (1987), que traz raríssimos depoimentos com o cineasta Mário Peixoto, autor de Limite (1931), ambos feitos por Reginaldo Gontijo e Luiz Fernando Suffiati.
Também vale citar Estudantes do Brasil (1987), de George Duarte, e BsB (1988), do mesmo George Duarte, agora em parceria com Cristina Quadra. Em 1988 é realizada também a exposição-evento Labirinto Transparente – vídeo-experimento do grupo Heleura Baboeilonests, que reúne artistas, músicos e poetas, nesse espetáculo multimídia, no prédio do Auditório Dois Candangos da UnB.
Em colaboração da Faculdade de Comunicação – UnB com o Instituto Goethe Brasília, foi montada em 1989, numa sala de aula da própria Faculdade, uma mostra internacional de vídeos e filmes experimentais, produzidos entre os anos de 1983 e 1987, nos formatos U-Matic e VHS. O evento se chamou VIDEO – En el Âmbito Experimental e de Largometrage, e ele veio aquecer ainda mais o interesse pela ferramenta audiovisual na universidade.
Nesse mesmo ano, acontece o I Encontro de Arte e Tecnologia da UnB, com a apresentação de inúmeros vídeos representativos da produção nacional e internacional. No evento ocorreram debates sobre tecnologia e estética, inclusive com a presença do professor Arlindo Machado, da PUC/SP, dentre vários outros pesquisadores e realizadores. Paralelamente foi organizada a pequena exposição Imagens Eletrônicas, promovida pelo Núcleo de Imagem da UnB, com os resultados das pesquisas realizadas até então no Instituto de Artes Visuais com imagem eletrônica, artes plásticas e vídeo.
Um evento que encarnou bem o espírito do it yourself5, bem à margem das institucionalidades, foi o Festival Vídeo Experimental, realizado no SESC–Garagem, na 913 Sul, em 1989, que apresentou produções em VHS de Cleon Homar e Margoth Iaggy. Entre os trabalhos em parceria da dupla, registramos videoclipes das bandas Kratz (1989), Zona (1989) e Cólera (1989), e também vídeo-poemas, como Versos Íntimos (1989) e Asas de Corvo (1989).
Com a boa vontade e a colaboração amorosa dos amigos para a gravação, edição, atuação e figuração, durante o ano de 1989, são realizados ainda, sob a direção de Margoth Iaggy, os vídeos Corpo Vazio, Big City e Morto Vivo – este com a participação do guitarrista Fejão, da banda de rock punk new wave Escola de Escândalo. Um outro vídeo, O Fome (1990), é também obra da dupla Cleon e Margoth. Trata-se de uma peça grotesca e cômica, ao mesmo tempo, sobre uma personagem monstruosa que engole pessoas, feita com cortes propositadamente grosseiros. Foi feita antes uma versão-ensaio, mais rústica, apresentada também no festival do SESC–Garagem, em 1989, chamada A Fome da Satélite. O videasta Cleon Homar continua o seu trabalho, realizando vários clipes para bandas da cidade: Death Slam, Political World (1993); Dungeon, State of Coma (1994); Câmbio Negro, Dê-nos Ouvidos (1994); Vernon Walters, O Futuro em Suas Mãos (1995) – este em parceria com a diretora Marcela Tamm; Zamaster, Divino (2003).
Um estranho incidente vem compor a temática para o vídeo Altares Mores (1990), de Vanderlei Schelbauer. A planejada exposição do artista goiano Antônio Carlos Elias esbarra com uma montanha de livros na Galeria Athos Bulcão, no exato local que daria lugar à instalação de suas peças executadas em ferro oxidado, e acaba gerando a performance registrada. Também dessa época é o vídeo Sinfonia Athos Bulcão (1990), do mesmo autor, produzido pela Câmera4, que registra a rotina diária no ateliê do artista Athos Bulcão, brincando com o acaso e a musicalidade.
Podemos ainda citar, nessa mesma linha criativa, os vídeos experimentais de Maria Maia, que também segue caminho não convencional. Ela trabalha os temas da poesia e da literatura, em obras como Inferno e Paixão (1992), que é inspirada na Divina Comédia de Dante Alighieri e nos textos de Clarisse Lispector. Em Os Deuses na Cidade (1995), suas referências são a mitologia grega. Em Espelhos Abomináveis (1996), ela dirige seu olhar à videodança, com a atriz e dançarina Eliana Carneiro. – Maria produz ainda alguns clipes musicais para a banda Marciano Sodomita – entre eles, o polêmico e irreverente Bosta (1997) –, para Os Alices, em 1998, e para a cantora Suzana Mares, também em 1998.
Outro autor cujos trabalhos são pouco conhecidos é Rodrigo Roal, que em 1992 realiza o divertido O Arquivo, adaptação do genial conto de Victor Giudice. Considerado à época como o conto brasileiro mais publicado no exterior, descreve satiricamente a rotineira saga de um trabalhador assalariado, no melhor estilo dos contos fantásticos de Jorge Luis Borges e Gabriel Garcia Marques. Nele João, representado por um ator amador, degrada-se paulatinamente... até transformar-se em um arquivo de metal. Ainda de autoria de Roal encontramos mais um exemplo dessa liberdade de composição quando registra, em Hower, o Faquir (1992) a performance de um norueguês brincando com agulhas, piercings, argolas e tatuagens, fazendo de seu corpo uma obra de arte viva.
O ano de 1991 marca o início do que se presumia uma grande transformação na produção audiovisual no Distrito Federal. A criação do Polo de Cinema e Vídeo do DF promoveria grandes mudanças, mas a política cultural do Governo Federal6 segue outras linhas de interesse, e com o desmantelamento do aparato de suporte à cultura o projeto do Polo não tem suporte.
Na 25ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 1992, avultam indefinições quanto ao futuro do cinema nacional. As tecnologias eletrônicas de gravação, edição e distribuição são cogitadas para os filmes nacionais em VHS (Video Home System). Nesse festival, pela primeira vez, tivemos uma mostra de vídeo ocupando importante espaço, num evento antes voltado exclusivamente ao cinema. A programação trouxe um viés documentarista, com a mostra de uma grande parte do acervo do CPCE, mas também de outras produtoras locais. Isso demonstrou a força do vídeo, enquanto revelava a potencialidade dos novos realizadores.
No mesmo ano de 1992 se realizou na UnB o Fórum Brasília de Artes Plásticas, que trouxe o videoartista americano Antonio Muntadas, para o Workshop Vídeo e Arte Contemporânea. Em sua segunda edição, no ano seguinte, agora com o nome Fórum Brasília de Artes Visuais, é realizada uma grande mostra de vídeo e cinema, com a apresentação de um acervo significativo de artistas de expressão internacional, a exemplo de Bill Viola, Gary Hill, Chris Robbins e Rachel Rosenthal. O Fórum traz ainda trabalhos do videasta americano Bruce Yonemoto, que oportunamente nos oferece a oficina Arte e Vídeo, no Instituto de Artes da UnB.
Uma retrospectiva expressiva da produção artística brasileira compõe a parcela nacional da mostra, com a apresentação de vídeos de Olívio Tavares, Rogério Sganzerla, Arthur Omar, Mário Carneiro, Carlos Vergara, entre outros.
Em 1994, a Fundação Athos Bulcão realiza a II Mostra de Vídeo, que reúne a mais expressiva produção brasileira da época, juntamente com a coletânea Território do Invisível, do fantástico videoartista estadunidense Bill Viola. Como parte do evento, é incluída uma pequena coletânea de vídeos produzidos pela Ema Vídeo e pelo CPCE para o programa Estação Ciência.
Nessa mesma época, um outro importante espaço de divulgação e estímulo à produção de vídeo na cidade é oferecido pelo projeto Espaço Vídeo, da Itaugaleria, que passa a exibir regularmente o acervo reunido pelo Instituto Cultural Itaú.
Procurando manter a regularidade, a Fundação Athos Bulcão promove, desta vez no auditório da Casa Thomas Jefferson, em 1995, mais um grande evento. Ela reúne a produção de artistas e videastas brasileiros, de videoartistas alemães e de artistas de vários outros centros produtores, principalmente dos Estados Unidos (EUA): a III Mostra de Vídeo da Fundação Athos Bulcão.
O material gráfico preparado para a divulgação do evento denuncia a importância que esse meio de expressão representa para o momento: um grande cartaz em cores fortes traz a palavra V-I-D-E-O diagramada na vertical, em letras garrafais. Um atestado de idoneidade para uma mídia ainda tão jovem.
No ano de 1997, Brasília recebe, no Espaço Cultural Renato Russo, com o apoio do SESC – Serviço Social do Comércio, uma mostra do Programa Intinerante Videobrasil 1997. Trata-se de uma coletânea, que reúne trabalhos de autores ligados aos grupos Olhar Eletrônico, TV Viva, TVDO, Videoverso, bem como obras vencedoras do Festival Videobrasil, e ainda outras, de países latinos, Argentina e Chile.
O destaque alcançado pela linguagem videográfica na primeira metade dos anos 90 se reflete no interesse dos artistas contemporâneos pelo uso dessa mídia em videoinstalações, em propostas de interatividade e em produções que demonstram a importância da imagem eletrônica no panorama universal da expressão humana, no final do século XX.
No Brasil, um dos precursores na fusão das artes plásticas e da computação gráfica é sem dúvida o artista brasiliense Sílvio Zamboni, nascido em São Paulo, responsável pela criação do setor de artes no CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Zamboni, professor do Instituto de Artes da UnB, apresenta em 1988/1989 os seus trabalhos realizados em um computador PC/XT, de apenas quatro cores, que fundem imagens digitalizadas de vídeo com poemas animados. Mesmo sem registro em fita de vídeo, por dificuldades técnicas, o trabalho foi apresentado em 1989 no Congresso da ANPAP. Em 1991, essa pesquisa faz parte de uma videoinstalação no MAC/USP. Hoje temos recuperados e digitalizados os seus trabalhos Poesia Visual em Computador (1990), Do Pontilhismo ao Computador e O Templo dos Signos (1993).
Inegavelmente a fusão entre a linguagem videográfica e as artes plásticas passa a viver um momento de intensa simbiose, revelada no forte apelo performático encontrado nas videoinstalações, que vem constituir uma linha expressiva de pesquisa sobre a condição do homem na contemporaneidade.
Um dos mais ativos e representativos grupos de pesquisa em arte contemporânea, que trabalha o vídeo e a imagem eletrônica como tônica em suas apresentações, é o Corpos Informáticos. O grupo inicia as suas atividades em 1991, nos Departamentos de Artes Visuais7 e de Artes Cênicas na UnB, organizado pela professora Bia Medeiros, composto por diversos alunos e pesquisadores. As performances do grupo procuram despertar a reflexão sobre o ser humano em sua relação ativa com as tecnologias colocadas pela imagem eletrônica, pela configuração virtual dos espaços e pelo conceito de obra de arte, em contínua evolução.
Atuam realizando intervenções urbanas, exposições, conferências, oficinas, apresentações de videoarte etc. Em 1995, apresentam a mostra Corpos Informáticos – Pesquisa em Linguagem Multimídia, na Sala Alberto Nepomuceno do Teatro Nacional, que reúne uma coletânea de seus trabalhos em videoarte. Pelo Projeto Obra Prima, o grupo apresenta uma instalação multimídia no ano de 1996, na Sala FUNARTE do Ministério da Cultura. Em 1997, monta a exposição Íncubos e Súcubos na Galeria da Caixa. Em 1998, o grupo organiza INCUBADORA, um evento multimídia, na mesma Galeria, que envolve a exposição de objetos, videoinstalações, performances, oficinas e conferências.
Como resultado do estímulo às pesquisas estéticas com a imagem eletrônica, especialmente com o vídeo, já agora incluídas nos currículos das escolas de arte, e reforçadas por bolsas de estudo de instituições como o CNPq e a CAPES, vamos assistir à crescente aquisição e disponibilização de novos equipamentos e tecnologias aos alunos de cursos de nível superior.
Muitos jovens artistas são incentivados dessa maneira, e passam a desenvolver projetos individuais e ou em grupos, sempre com significativos resultados. Dentro do Instituto de Artes da UnB também se forma um núcleo produtor. Da produção oriunda das pesquisas desses alunos-artistas, podemos citar: Videonírese (1996), Palladium (1995) e F-X-X-X-T (1995), trabalhos de Frederyck Sidou, que elevam a sensorialidade das imagens ao extremo; Pintura (1995), de Milton Marques, explora a texturização pictórica da tela; Varrum (1995), de Carla Rocha, provoca arrepios, com sua crueza visceral; Virtual (1995), de Alice Stephanie, explora os efeitos da duplicação da imagem e do infinito; Signal, Palavras e Olhar de Dentro (1996), de Rodrigo Paglieri, são três obras cuja sutileza buscam levar à reflexão sobre a ilusão e o processo transgressivo na arte. Numa fase mais recente, entre os anos de 2006 e 2013, o grupo passa a contar com a participação do videoartista Márcio Mota, que elabora obras inquietantes como o premiado Olho no Lance (2009), Nuclear Dance (2009) e muitos mais.
O evento Panorama das Artes Visuais no Distrito Federal, realizado em 1998, pela Fundação Cultural do Distrito Federal/GDF, envolve praticamente todos os espaços culturais da cidade. Ele no entanto reflete um certo esgotamento nos processos de experimentação e inovação. Assim fica reduzido o espaço para exposição de trabalhos de videoarte e de videoinstalações a uma pequena mostra, resumida a apenas três artistas, em cada modalidade.
A produção brasiliense à época, absorvida dentro do chamado universo do digital, vive uma revitalização. Vale aqui citar o Festival Muvi, mostra que aconteceu no Teatro Dulcina de Moraes/FBT, com edições em 2003 e 2004. Outro projeto foi o Ultimaquarta – mostra de videoarte, que se inicia no final de Setembro de 2004 e se estende até o ano de 2008, na Sala Alberto Nepomuceno do Teatro Nacional. Criada pelos artistas Oziel Araújo e Sofia Fernandes, conta com o apoio do Projeto Arte Por Toda Parte, e ocupa as últimas quartas-feiras dos meses em que se realiza.
O Ultimaquarta se diferencia por abrir espaço aos criadores sem critérios rigorosos de curadoria. Todo tipo de proposta portanto foi ali bem-vinda. Desde que coubesse num formato de no máximo 10min. Muitos artistas e produtores independentes se interessaram e ocuparam esse espaço, aberto também a participantes de outros estados. Ali assistimos a obras de Clarissa Borges, Cila McDowell, Marta Penner, Milton Marques, Daniela Bezerra, Oziel Araújo, Elyeser Szturm, André Santângelo, Luiz Oliviéri, Solymar Lacerda, Eliana Carneiro, e de Gontijo, para citar alguns.
O início da primeira década do século XXI é marcado por crescente interesse pelo vídeo e suas possibilidades. Várias escolas inauguram cursos de Comunicação voltados para a produção audiovisual, e passamos a ter uma maior profissionalização dos processos de criação. Os cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Audiovisual e Cinema atraem um número crescente de estudantes ao ensino superior, e vemos então um aumento sensível da produção local, já estruturada a partir da tecnologia de gravação digital e de edição não-linear da imagem em movimento.
Reestrutura-se o curso de cinema na UnB, agora como uma habilitação em Audiovisual do curso de Comunicação Social. O ambiente criativo agora tem bases nas redes sociais e nos desperta para a importância de modelos que se desenham a partir de novos ambientes. Nos alunos da UnB, vamos encontrar uma preocupação em ir de encontro a questões colocadas por esses novos suportes de comunicação, e assim nasce por exemplo a websérie Arena, com estreia em Agosto de 2017. Outras escolas também têm se adaptado ao poder exercido pelo audiovisual, nos ambientes da web.
Na Universidade Católica de Brasília foi montado, ainda em 1999, o núcleo de produção CRTV (Centro de Produção em Rádio e TV), para atender aos bacharéis em Comunicação, no tocante à produção audiovisual. Hoje eles buscam integrar os seus produtos diretamente aos canais da web.
Uma produção bem diversificada surge desde o início das atividades do CRTV, com a produção de documentários, videoclipes, até peças de ficção. Com uma estrutura sólida e professores estimuladores, a Católica ocupa uma posição de destaque na produção audiovisual brasiliense. Também outras escolas particulares de nível superior abriram cursos, mas de curta duração (tecnólogos), com formação em Audiovisual, entre elas UNICESP, UNIP, Anhanguera.
Em 2007, o IESB (Centro Universitário IESB) abre o curso de Cinema e Mídias Digitais, um bacharelado dedicado à formação profissional em cinema e vídeo. A escola oferece uma estrutura poderosa e atrativa aos alunos. É surpreendente a qualidade das obras produzidas pelos jovens estudantes daquela instituição. Passa a ser referência de qualidade no DF, com representatividade garantida e posição diferenciada nos certames em Brasília.
Uma nova geração de realizadores surge nesse ínício da década de 2000, em Brasília, e ocupa um lugar de excelência no trato com a linguagem audiovisual. Amparada por uma maior disponibilidade de equipamentos, tem também maior possibilidade de obter melhores resultados. Cineastas como Neto Borges, Marcelo Diaz, Alex Vidigal, Adriana de Andrade, Cícero Fraga, entre outros que se destacam, vêm usando o suporte vídeo já há bastante tempo para realizar as suas obras. Os resultados são de grande expressividade, com participação intensa em mostras e festivais. Alguns realizadores que até então preferiam a película inevitavelmente vêm migrando para o suporte digital.
No tocante à valorização do experimental e do artístico, o vácuo deixado pelo Ultimaquarta é ocupado, a partir de 2008, pelo Projeto Lacuna, concebido pela artista e arte-educadora Mayra Miranda. O seu foco é a reflexão sobre videoarte e a divulgação da produção local.
Além de realizar suas mostras autônomas, o Lacuna participa de projetos como o Fora d@ Eixo, de eventos em galerias de arte e ateliês de artistas. A manutenção de um canal no Youtube pelo projeto foi efêmera, gerou poucos frutos até então. Mais recentemente, o projeto tem se concentrado em eventos pontuais e temáticos, como o Lacuna Proibidão, que aborda o erotismo. O Lacuna Proibidão aconteceu em 2017, numa parceria com o Projeto Fuga.
Entre os anos de 2006 e 2008, abre-se espaço em uma casa noturna para o evento Cine Gate’s – Festival de Curtas do Gate’s Pub, num ambiente atrativo e descontraído. No entanto, após três anos consecutivos de realização, o festival fecha as portas, impactado pela crise financeira que vive a casa, apesar do sucesso do evento.
Desde 1998, um aguerrido grupo de amigos dedicado à sétima arte insiste em fazer uma mostra de curtas em Taguatinga-DF. E agora, em sua 13ª edição, já se firma como um importante festival, de âmbito nacional, com programação extensa e representativa, recheada de debates e com presença forte na web: o Festival Taguatinga de Cinema. Sua abrangência atende a uma grande plateia nacional, além de oferecer formação e cultura para a comunidade local.
O Festival de Filmes Curtíssimos, agora Lobo Fest, oferece desde 2008 opções para conhecer a produção internacional de filmes em curta-metragem, além de incentivar a participação da produção local por meio de prêmios, oficinas, debates, lançamentos de livros e DVDs. Em 2018, ele realiza a sua décima edição, enquanto expande a sua atuação para novos formatos, que agora inclui longas, médias e curtas-metragens, com foco em produção independente, experimental e fora do circuito comercial. Busca com mais especial atenção novos patamares de ambiência e de relação do homem com o planeta.
Na década de 2010, vemos outras mostras e festivais surgirem e se firmarem, com forte expressão da cultura cinematográfica local. Um deles é o Curta Brasília – Festival Internacional de Curta-Metragem, já com seis edições realizadas, com uma presença rica e estimulante, em expansão desde a sua primeira edição, em 2012. A participação de embaixadas e as parcerias internacionais trazem um sabor exótico à programação, que se mescla com as participações gastronômicas e musicais nativas de Brasília.
A cada dia, nos surpreendemos com a riqueza de obras que o vídeo, agora como cinema digital, tem nos oferecido por intermédio dos jovens criadores e amantes da linguagem audiovisual. Não falamos mais em “vídeo independente”, pois esse conceito tem perdido seu sentido. Quando falamos de audiovisual, Brasília faz escola, faz cinema!
Referências:
1) Mesmo estando prevista em seu projeto original, a UnB nunca chegou a receber a concessão de um canal de televisão, em função da situação política que viveu o país, desde a fundação da Universidade, em 1963.
2) Dados fornecidos pelo Prof. Dr. Armando Bulcão, da Faculdade de Comunicação da UnB, em 2003.
3) Disponível em: <http://www.canal100.com.br/historia.htm>. Acessado em: 07 out. 2005.
4) É conveniente lembrar que os equipamentos em formato Betacam (1/2”), da Sony, que propiciam melhor qualidade de imagem, só passaram a ser comercializados a partir do final dos anos 80. Apenas no início dos 90 chegam os primeiros equipamentos desse formato ao CPCE; devido a sua alta performance, o formato Betacam (e depois o Betacam-SP) se torna padrão mundial nos sistemas de televisão.
5) “Faça você mesmo”, emblema bem-sucedido dos criativos punks do rock’n’roll mundial, movimento ainda dos anos 70, até hoje vivo.
6) O então eleito Presidente Fernando Collor desmonta toda a estrutura da Embrafilme – que, aliás, já sentia a força da decadência.
7) É digno de citação o trabalho pioneiro da pesquisadora e professora Suzette Venturelli, da UnB, junto ao grupo performático Corpo Piloto, que reuniu alunos do então Departamento de Desenho, nos anos de 1986 e 1987, que envolveu também a produção e a projeção de vídeos.
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